segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Havana


Dia 19 de janeiro, sábado

"Poucas cidades exercem um fascínio tão grande quanto Havana. Em que outro lugar um guerrilheiro como Che Guevara iria de limusine para o Banco Central, onde era presidente?
Al Capone chefiou a Máfia norte-americana do sexto andar do Hotel Sevilla, onde Graham Greene situou parte do romance Nosso homem em Havana.
Winston Churchill descansou ao final da guerra numa suíte do Hotel Nacional, degustando charutos cubanos. Ava Gardner, Errol Flynn, Marlon Brando e Clark Gable também gostavam de passar férias no Nacional.
Ernest Hemingway comemorou o Prêmnio Nobel de Literatura na cidade e depois foi tomar mojito no La Bodeguita, o bar preferido de Salvador Allende e Nat King Cole, popularizado no Brasil nos versos de Chico Buarque.
O garçom Constante Ribalaigua colocou o El Floridita na história ao usar gelo picado para criar uma bebida à base de rum claro com suco de limão, batizada de daiquiri.
Ah, e quase esquecia: Gabriel Garcia Márquez e Fidel Castro ainda moram lá.
Aos poucos, à medida que as leis impostas pelo partido comunista caem em desuso, Havana recupera o charme. Comecei minha aventura ouvindo jazz no Malecón, entre as belas filhas de Oxum, e terminei no Tropicana Nightclub, um dos mais famosos cabarés do mundo.
Estas crônicas procuram resgatar parte dessas histórias e mostrar como os havaneses vivem – lutando contra as dificuldades econômicas, mas orgulhosos de sua capital."

Airton Ortiz, autor de Expedições Urbanas: Havana, Ed Record

Conhecer Cuba era algo há mais tempo pensado. Saímos de Porto Alegre felizes por sabermos, um tanto inesperadamente, que estaríamos na classe executiva da COPA Airlaines. Não sei exatamente como isto aconteceu, mas pela primeira vez na vida viajamos com mordomias de refeições, bebidas especiais, filme, cobertorzinho, etc. Foi um voo especial mesmo! Fizemos escala no Panamá, onde tivemos que esperar 4 horas, então, ficamos andando e conhecendo o enorme aeroporto.
Chegamos em Cuba à noite. Nos esperava no aeroporto José Martí o sr. Abel, que nos conduziria ao centro - Habana Vieja - até um apartamento vizinho ao de seu irmão. Pois é, reservamos com o irmão do Abel – “Las Terrazas de Manolo”- mas o Manolo nos alertou por e-mail que estava lotado e ficaríamos em uma vizinha sua. Ao sairmos do aeroporto vimos o enorme e velho Ford 54 azul que nos esperava. Colocamos as malas e andamos por alguns metros até sermos barrados por um policial que ficou mais de meia hora conversando e explicando coisas para o Abel. Pelo que entendemos, não era permitido que um carro que não fosse táxi do aeroporto aguardasse turistas, então, o policial chamou um táxi comum (ou seja, com identificação de táxi, novinho, moderno – que pena!!!), para o qual tivemos que ir. Não vimos mais o Abel, pois ele teve que ficar lá com o carro e provavelmente foi multado.
 Já era tarde quando chegamos no destino – rua Cuba, nº 611. Quem nos aguardava eram o Octávio e sua irmã Célia, que cuidam do apartamento, cuja única função parece ser o aluguel de quartos para turistas – especialmente europeus. Nos hospedamos em dois quartos que, como o resto do ap tem decoração antiga e um tanto brega em alguns itens, mas lustres de cristal lindíssimos (até no banheiro) e tudo muito limpo. 











Dia 20 de janeiro, domingo
Café da manhã surpreendente: suco natural, café, leite, iogurte, 1 prato de frutas variadas (todas descascadas, cortadas e muito doces) para cada um, pãezinhos fofinhos aquecidos no forno, mel, manteiga. A Célia comentou que comíamos pouco no café da manhã. O padrão dela é dos alemães, que devoram ovos, bacon, etc por isso nos cobrou bem menos do que seria o preço – sim, o café é pago à parte – U$5,00, mas pagamos U$2,00 por pessoa.
 Habana Vieja é velha mesmo...e bonita...e diferente... e pitoresca...e feia em alguns lugares. Muita gente pelas ruas estreitas, muitos riquixás, cocotáxis, motos com o caroneiro do lado, etc. Falta pintura nos prédios, falta arrumar a fiação – é de enlouquecer o monte de fios elétricos puxados por fora dos prédios, pelas escadas, enrolados, uma confusão! Mas os prédios, em geral, são lindos, clássicos, enormes escadarias, sacadas charmosas, janelas e portas altas, bonitas. Já os lugares turísticos, estão bem arrumados, restaurados.
Começamos visitando a Plaza da Catedral, muito bonita com sua igreja antiga em frente ao grande vão que é circundado por sobrados e casarios lindíssimos, com vitrais coloridos e tudo mais em tons de azul e branco. Caminhamos um pouco até a famosa Bodeguita del Medio, onde já antes do almoço estava um excelente grupo de músicos cantando, gente acompanhando, fotografando, etc. Vimos da rua mesmo porque o lugar, como sempre, pelo que dizem, estava cheio. A Bodeguita foi imortalizada por ter sido local frequentado pelo Nobel de literatura Ernest Hemingway. Curiosidade: Ernest Hemingway viveu em Havana alguns meses e por mais de 20 anos numa cidadezinha próxima à capital, durante este tempo escreveu O Velho e o Mar. O romance foi baseado na pequena cidade portuária de Cojimar, onde Hemingway guardou seu próprio barco de pesca e o personagem principal foi baseado em um pescador local que ele conhecia.
Seguimos até a beira mar para andar um pouco pelo agradável calçadão, o Malecón, e apreciar a cidade de outros ângulos. Decidimos pegar o ônibus turístico que faz um passeio bem bacana pelas principais atrações e leva também até bairros mais afastados. Como podíamos descer e retornar ao ônibus, ficamos inicialmente na praça em frente ao Capitólio, vimos os prédios lindos ao redor dela e tentamos visitar o Capitólio, mas soubemos que estava fechado para reformas L.
Visitamos O Museu de Belas Artes Cubano – fantástico!!!! Exigiria um dia inteiro para ser bem apreciado, escolhemos algumas alas que nos interessavam mais, mas o problema é que isto representava uns 80%. Vimos muuuuitas obras interessantes - arte do período colonial até os tempos atuais.
Saímos às 17h, quando o Museu fechou e depois desta visita, cansados, acabamos comendo muito bem no restaurante Asturiano, ali perto. Os pratos vieram lindos, enfeitados e bem generosos, de camarão e lagosta. A comida em Cuba é barata, mas não muito elaborada ou variada, então, alguns lugares acabaram surpreendendo positivamente, como este. Uma coisa que nos chamou a atenção foi que é permitido fumar na maioria dos ambientes fechados, inclusive restaurantes. Já não estávamos mais acostumados a isto....também pudera, na terra dos charutos!
Após este almo-janta, caminhamos por um calçadão em frente ao restaurante, denominado Paseo Prado, onde os ricos costumavam passear de charrete e sentar para apreciarem e serem vistos. O local é bem prazeroso e hoje é tomado por artistas de rua que expõem suas obras e pessoas conversando nos bancos.
 Pegamos novamente o ônibus turístico e fomos até a Praça da Revolução, enorme, com o imponente monumento a José Martí à frente e no outro extremo os dois edifícios com as imagens de Che Guevara e Camilo Cienfuegos em cada um. Dá para ficar imaginando os grandes atos públicos que já se sucederam ali, sempre com os intermináveis e enfáticos discursos de Fidel Castro. Bem ao lado da Praça fica o Teatro Nacional e infelizmente não havia “funciones” nestes dias em que estaríamos em Havana, o prédio por fora, é bem interessante e moderno.
Voltamos ao HabanaBusTur – sempre no andar de cima, aberto, é claro. Passamos por uma área mais nova da cidade, zona de hotéis, o aquário da cidade e pelo cemitério – Necrópolis de Colón, as embaixadas de vários países, um pedaço do Malecón e descemos novamente na praça do Capitólio. Junto a esta praça, descobrimos outro point ligado à história de Ernest Hemingway – o bar e restaurante Floridita, onde dizem, foi inventado o daiquiri. Então, nosso pedido não poderia ser outro – provamos o famoso e bom mesmo(!) daiquiri do Floridita. A conta, de dois drinks e dois sucos foi beeem salgada, mas valeu por ver o lugar, muito charmoso e tirar foto com a estátua do escritor num canto do balcão. Bem, fizemos muita coisa neste dia!!! Decidimos ir para casa e tomar banho. Depois conhecemos ainda a Plaza de Armas (uma das ruas, em frente ao Teatro tem o calçamento de madeira) e a Plaza Vieja. Esta última, muito recentemente restaurada e maravilhosa. Comemos uns sanduíches, “tapas de salmón” e salada e depois, retornamos para nosso ap.

21 de janeiro, segunda
No nosso segundo dia de Havana resolvemos ver inicialmente a Camara Oscura que foi instalada no último andar de um prédio junto à Plaza Vieja e proporciona interessantes vistas da cidade através de um jogo de espelhos. Avistamos o porto, a cúpula do Capitólio (copiado do americano), algumas igrejas, uma com uma grande cúpula dourada, o farol e todo o contraste de prédios antigos muito detonados e outros lindíssimos, já restaurados, como é o caso das praças, belíssimas, próximas ao prédio da Camara Oscura.  Ali ao lado compramos ingressos para um show noturno do Conjunto Roberto Faz.
Depois fomos à Plaza de Armas, onde há uma espécie de brique, com vários vendedores de livros, discos de vinil, cartazes da época de revolução e diversos souvenirs expostos. O local é bem agradável, cercado de restaurantes e bares com mesas nas ruas sob toldos para proteger do sol quente de Cuba. Neste momento muitos turistas europeus que faziam parte de um cruzeiro estavam chegando à praça.
Caminhamos pelo centro, especialmente a movimentada rua Obispo, que só admite pedestres e é o coração da cidade, admirando a diversidade da população, entre turistas esquisitos, cubanos muito arrumados, com seus cabelos bem cortados e estruturados com gel, as mulheres com unhas bem feitas, estudantes em seus uniformes (cada ciclo da escola tem sua própria cor – amarelo/ocre, azul ou bordô), etc. Na Infotur, nesta mesma rua central, pegamos algumas informações sobre atrações de cidades do interior para formar nosso roteiro, já que desejávamos conhecer várias outras cidades de Cuba também.
Numa das caminhadas fomos surpreendidos por uma cubana que se apresentou como Mariela, se dizia vizinha da casa onde estávamos e nos levou à casa de uns trabalhadores da empresa de charutos Partagás, que ficava justo ali nas imediações, dizendo que aquele era o dia em que os funcionários das fábricas de charutos podiam vender a cota que ganhavam e que em relação aos preços normais de mercado eram muito vantajosos. Ficamos muito desconfiados,...parecia conversa pra enganar turista e, acho que era mesmo... nem fumamos charuto,  mas resolvemos comprar alguma coisa para presentear amigos.  Mariela ainda nos levou a um local onde haveria um show de salsa. Tomamos um suco e drinks com ela e não esperamos este show iniciar – muito estranho, no meio da tarde!
 Dali seguimos para a agência de viagens no Hotel Saratoga, onde reservamos duas diárias em um resort all inclusive (não é o nosso tipo de passeio, mas queríamos conhecer um pouco de tudo em Cuba, inclusive os famosos “Cayos” – praias em ilhas paradisíacas  – e este era o melhor jeito). Caminhamos novamente pela rua Obispo, até o Hotel Ambos Mundos, muito bem localizado, em pleno centro da cidade velha, tem no térreo uma agência de aluguel de carros, onde fomos alugar um veículo para nossa jornada pelo interior cubano. O Hotel Ambos Mundos é um capítulo à parte, ponto turístico em função de ter sido a casa de Ernest Hemingway por algum tempo, tem muitas fotos no térreo mostrando seu ilustre hóspede e vários amigos famosos. Muitos grupos de excursão chegavam acompanhados de seus guias, que explicavam sobre a vida do escritor, prêmio Nobel de literatura, e do próprio hotel. Sentamos no bar, junto à recepção para comer uns sanduíches e tomar refrigerantes, água. Claro, em Cuba não se encontra coca-cola, então, tomamos “Tu Kola”, a versão cola de Cuba, e uma bebida chamada Malta (adocicada, não nos agradou).
Depois de termos o básico planejado para nossa jornada nos dias seguintes (carro e 2 diárias em um resort), caminhamos até o Museu de La Revolución. O prédio foi construído para ser o Palácio Presidencial e era considerado um símbolo da corrupção administrativa da época do ditador Fulgencio Batista, que foi derrubado pela revolução dos barbudos, em 1959. O acervo tem objetos, fotos e documentos que contam desde a tomada fracassada do quartel de Moncada até a chegada vitoriosa dos revolucionários à capital. A construção em si, é lindíssima, imponente, toda pintada de branco, com uma grande cúpula no centro e uma mescla de estilos, situada de frente para uma praça comprida que desemboca no Malecón. Entra-se por arcos que estão na base do prédio e as escadarias em mármore conduzem até as salas de exposição que contam e exaltam a história de Che Guevara, Fidel Castro, Raul Castro, Camilo Cienfuegos e outros companheiros no final da década de 50. Uma bandeira linda de Cuba, que ocupa todo o vão do teto altíssimo até o chão fica aberta no centro do prédio. Numa das galerias vê-se as marcas das balas nas paredes, resultado de uma das batalhas travadas no local, durante a ocupação pelos revolucionários. Anexo ao Museu, atrás dele, foi construído o Memorial Granma todo envidraçado – para abrigar o famoso iate Granma, que conduziu os revolucionários do México até Cuba, em sua primeira investida para deflagrar a revolução. No Memorial também estão carros militares da época, lançadores de mísseis, artefatos variados da guerra.
Ao sairmos do Museu ainda conseguimos caminhar pelo agradável calçadão à beira mar, democrático e interessante, onde muita gente de Havana termina suas tardes, como nós, assistindo ao por do sol.

 Voltamos para casa, sempre a pé, isto é muito bom em Habana Vieja, faz-se muita coisa caminhando, e nos preparamos para o show da noite. Fomos a pé, pois o show também era pertinho, no centro antigo. O Ricardo deu uma dentro comprando ingressos para o show, com janta, na 1ª fila, nossa mesa ficava grudada no show. E isso foi muito bom, pois não havia palco, então, as pessoas que estavam longe não viam metade das performances, pés e rebolados do casal de dançarinos excelentes que nesta noite animou a apresentação. Os músicos e cantores do “Conjunto Roberto Faz” equivaliam a uma velhíssima guarda de escola de samba, ou seja, muitos deles eram os velhinhos que nas décadas de 60 e 70 arrasavam na salsa, na rumba, no bolero. Muitos instrumentos de sopro e percussão. Foi maravilhoso – a comida nem tanto, mas o show, valeu muito! Divertido, os bailarinos tiraram duas vezes o Ricardo para dançar e, no final, o Artur e a Luísa também foram. Voltamos para casa na escuridão de Habana Vieja – sim, a iluminação pública é muuuuito precária e, apesar disto e da aparência de fim de guerra de vários prédios do trajeto, sentimo-nos seguros, o clima era de muita tranquilidade pelas ruas à noite. 

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